Já repeti em diversas ocasiões a minha opinião acerca da figura do referendo.
Enquanto instrumento de democracia directa obviamente que é de salutar e primordial importância: determinada opção política ser sufragada "directa e universalmente" pelos cidadãos e, da opinião destes, estatuir e prosseguir com a decisão e arcar com as devidas consequências e responsabilidades.
Ora, a realidade política portuguesa assenta no parlamentarismo representativo, ou seja, periodicamente são sufragados os representantes dos portugueses para representarem os seus legítimos interesses no órgão de soberania Assembleia da República,
Assim, a figura do referendo, a meu ver, só tem sentido de utilização quando se trate de temáticas fracturantes, como a organização político-social.
Seria lógico sufragar em sede de referendo a adesão às então comunidades europeias, à União Económica e Monetária, à Constituição Europeia...
Agora referendar posições ético-morais sobre o aborto? Referendar um princípio consagrado na Constituição, a Regionalização? Isto representa falta de coragem política e desresponsabilização dos políticos eleitos democraticamente (assim se diz) pelo povo.
Assim, a utilização do referendo em Portugal não é mais do que uma fantochada com os inerentes encargos financeiros para os cidadãos que elegeram um bando de deputados, com maioria absiluta, para governarem o país em determinado sentido.
Em relação à actualidade "referendária" nacional, poderá ser questionado, em sede da teoria do crime, se a sociedade portuguesa entende como condenável a conduta da interrupção voluntária da gravidez?! E se sim, se a natureza do acto ilícito deverá ser punida do ponto de vista criminal ou contra-ordenacional? Mas, por exemplo, houve referendo para a despenalização do consumo de estupefacientes? Há quem concorde, há quem discorde, mas a decisão não foi tomada?
Realidades distintas, sim senhor, mas o princípio é o mesmo: a decisão de des/criminalização de determinada conduta é, e deverá ser sempre feita, num Estado de Direito Democrático, pelos órgãos representativos eleitos pelos cidadãos.