quinta-feira, outubro 12, 2006

Sócrates e as reformas (I - Saúde)

Desde que o senhor engenheiro pôs as gânfias no poder este país tem sido uma aventura dos diabos.
Isto está tudo mal, então vamos lá a reformar.
Primeiro, reforma quer dizer, de acordo com o priberam.pt: acto ou efeito de reformar; mudança para melhor; melhoramento; conserto; reparação; restauração; modificação; reorganização; substituição de objectos fora de uso; modificação de uma ordem existente; nova organização; nova forma; novo feitio; estatuto de um ex-trabalhador, beneficiário do sistema de segurança social da Caixa de Previdência, que recebe uma pensão vitalícia por ter sido dado como incapaz para o serviço, ao atingir o limite de idade ou devido a invalidez; situação de um militar ou funcionário público nas mesmas circunstâncias; aposentação; jubilação.
A palavra, atendendo à plêiade de significados, até pode estar bem empregue, mas acho que quando é mesmo para mudar de paradigma, isto só lá vai com revoluções.
Assim:
Sócrates
- Então vamos lá a reformar a saúde dos portugueses. E de que forma perguntas-me, Silva Pereira!?
Silva Pereira
- De que forma, grande mestre, irás tu proceder à reforma da saúde deste povo?
Sócrates
- Eu tive uma visão, das quais os oráculos mais sapientes nunca se lembraram. Em primeiro lugar, vamos reformar a assistência médica dos funcionários públicos. Depois, actuaremos segundo a mais correcta profilaxia, reformando o sistema de urgências. Em terceiro lugar, a estratégia para a saúde terá de apostar numa clara e eficiente utilização dos recursos financeiros, pelo que iremos reformar as fontes de receitas do sector.
Silva Pereira
- Grande mestre, de te ouvir deleitadamente, não consigo no entanto descortinar o sentido dessas grandes reformas!? Mas apoiarte-ei até ao fim, visto seres tu, e também o Correia de Campos, aquele-que-a-tudo-responde, quase-deuses!
Sócrates
- Ora, Silva Pereira, muito simples. Os funcionários públicos tem a ADSE e os múltiplos subsistemas, e como a saúde é uma regalia, acabemos com isso! Mas, antevendo tumultos nas ruas, apesar de não temer ninguém, vai devagarinho!
Silva Pereira
- Mas a Constituição diz que a saúde é um direito, tendencialmente gratuito! Em que ficamos? Ó Grande Mestre, mas os funcionários públicos não têm também um conjunto de obrigações que os do sector privado não têm? Onde fica a igualdade e equidade na diferença?
Sócrates
- Ó Silva Pereira, a perguntas provocatória não respondo.
Silva Pereira
- Desculpa Grande Mestre! Mil perdões os meus joelhos e coluna vertebral se entortam perante a tua magna sapiência! Por falar em magna sapiência, ó grande eloquente, Mestre de todos nós, então e as urgências.
Sócrates
- Bem das urgências, o Correia de Campos, aquele-que-a-tudo-responde, é que é o especialista. Mas eu, detentor da sapiência suprema te digo uma coisa, é uma medida de gestão inovadora que desenvolverá o país na tendência dos países mais desenvolvidos, integrando Portugal nas vanguardas da administração de saúde mundial!
Silva Pereira
- Bravo, Grande Mestre! Como poderia eu, aquele-que-tem-sempre-dúvidas, algum dia conseguir pensar como tu!? E já agora, e da clara e eficiente utilização dos recursos financeiros no sector da saúde?
Sócrates
- Prestável Silva Pereira, em relação a isso, apesar de o Correia de Campos, aquele-que-a-tudo-responde, ser o eterno mentor, duas palavras: primeira, não aumentamos os impostos para financiar o défice da saúde; segunda, lançamos uma medida que se ajusta ao princípio socialista de que todos devemos contribuir e, assim, lançaremos uma nova taxa moderadora para os internamentos hospitalares. Revelar-se-ão duas medidas encantadores no longo prazo!
Silva Pereira
- Grande Mestre, perfeito. Assim a gestão eficiente dos recursos financeiros na saúde passa por não aumentar os impostos, e por outro lado criar uma justa taxa que terá por principal objectivo, sendo moderadora, a de evitar que hajam internamentos decorrentes da necessidade de cuidados médicos. Assim, um doente que careça de uma intervenção cirúrgica, ou tem dinheiro para pagar as taxas moderadoras, ou mais vale ir apanhar caracóis!
Sócrates
- Silva Pereira, as prelecções a que tens assistido, nomeadamente as proferidas por mim, têm incutido em ti um espírito de abertura à sapiência...

4 Comments:

At 4:21 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Adorei o diálogo!
No entanto, e não sendo especial admiradora do governo socialista, tenho de dar a mão à palmatória no sentido de que 5 euros por dia não é NADA além de simbólico para os internamentos, 14 dias é um bom período de tempo e o pagamento não será exigido discricionariamente: haverá bastantes isenções, de acordo com os rendimentos do utente. Se é muito bonito na teoria mas será um caos na prática? Provavelmente... Mas a demonstração de má vontade por qualquer e toda medida legislativa deste país já começa a ser démodé... Temos de ser um bocadinho mais flexíveis. É, sem dúvida, a paga de anos de má gestão. Mas pior, pior, ainda é o embargo a Cuba! Não estamos tão mal quanto isso, pois não? Pelo menos ainda!

 
At 1:40 da manhã, Blogger botadeelastico said...

Em primeiro lugar, a taxa de internamento vai ao arrepio do consagrado na Constituição em que todos os cidadãos têm direito à saúde e que esta deverá ser tendência gratuita. Po outro lado, um internamento de 10 dias representa 50 euros no final, que o doente terá de suportar. Acrescido da taxa moderadora de utilização (masi cerca de 5 euros), dos medicamentos que terá de adqurir para o recobro e taxas moderadoras para a mudança de pensos e afins (quando necessário, se resultante de intervenção cirúrgica), nunca um internamento ficará a um cidadão por menos de 100 euros. Ora atendendendo a que o salário mínimo é inferior a 400 euros, uma pessoa que aufira este valor (apesar de, momentaneamente, poder estar isento) ficará com 1/4 do rendimento no Ministério da Saúde. Se ganhar 600 euro (e não isento), 1/6 do salário. E a renda de casa, a alimentação, o vestuário?
Acima de tudo, não se pode considerar que a contribuição, que numa lógica de quem paga impostos e com consciência cívica, é de todo louvável, com uma noção de serviço público que procura a preservação e salvaguarda do maior direito, a vida.
Há que referir que o embargo a Cuba (pelos EUA) tem como contraponto educação gratuita e de qualidade, serviços médicos gratuitos de de excelente qualidade, e segurança interna e externa (apesar de um ou outro atropelo aos direitos humanos, mas que cá tanbém os há). Pode não ser o paraíso, mas é quase. Obviamente que o nível de vida português é melhor que o cubano, até porque são realdades incomparáveis.
Incotornável é que a política de saúde (bem como todas as outras) seguida por este governo incide na procura de receita pública para financiar o défice, ao invés de proceder à determnação dos factores críticos indutores de despesismo (e não despesa), designadamente, operacionalização de um modelo de gestão transversal (horizontal) nos domínios administrativos e de recursos humanos (eliminar departamentos de recursos humanos nas organizações regionais de saúde e hospitais), nos grandes centros urbanos proceder a uma maior centralização da prestação de cuidados de saúde (por exemplo, existem alas do Hospital Santa Maria desocupadas), implementação de serviços estomatológicos públicos capazes (ainda há poucos dias vi uma notícia em que a saúde oral portuguesa era uma lástima). Por exemplo, o financiamento público das clínicas e consultórios odontológicos por via da comparticipação seria bastante reduzido, e, se bem gerido e bem executado clinicamente, o serviço público mais económico, eficiente e eficaz (as parangonas da boa gestão e actuação pública).
Ainda de referir que ninguém sabe exactamente o montante dos gastos em saúde e a expectativa do seu tendencial aumento (envelhecimento da população, desenvolvimento científico, etc.), e é aqui que o governo deveria agir.

 
At 6:02 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Rapaz! Eu falei no EMBARGO, não quis de forma alguma criticar Cuba. Se bem que, como contraponto de tudo o explanado, facto é que vivem em extrema pobreza, mas adiante...
Não te chateies comigo, PAH! Fiz um comentário inocente à tua sátira política! Bolas.............

 
At 12:15 da manhã, Blogger botadeelastico said...

Mas a questão não é o embargo. É o assalto que o governo está a fazer aos cidadãos, retirando-lhes direitos, dinheiro, e só não começou a tirar o escalpe porque não são sioux.

 

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